O que torna fantástico esse trabalho de leitura do prof. Lombardo é que a Ilíada foi composta para ser cantada e ouvida e não lida.
domingo, 17 de novembro de 2013
terça-feira, 1 de outubro de 2013
Do que não se aproveita em uma dissertação de mestrado ( I )

Um homem chega de viajem a um país estrangeiro; pessoas na estação de trem poderiam descrever sua chegada, seus gestos e eventuais palavras, até mesmo seu estado de espírito: trata-se de um fato histórico? E se esse homem fosse Francisco Ferdinando a desembarcar em Belgrado? Estaríamos diante de um fato histórico? Os eventuais relatos, anotados por acaso ou curiosidade por um jornalista ou transeunte, se converteriam, por isso, em documentos históricos? Que difere a viajem de Chico e de Francisco, para que esta seja um dado da história factual, enquanto aquela só é histórica num sentido inteiramente diverso[1]?
Diz-se que Napoleão III representava os interesses na burguesia rural francesa[2], mas tal fato já não é apreendido como a chegada do arqueduque a Belgrado.
Que dizer então de um “evento” como a Revolução Francesa? Que compreender por esse termo? Atos individuais? Movimentos coletivos? O fruto de deliberações conscientes ou o produto de forças impessoais?
E se nos desvencilhamos da história eventual, nem por isso a questão do fato histórico se torna mais simples. Descreve-se o sistema político da República Romana, distingue-se ele da do sistema monárquico que o antecedeu e do império que o sucedeu. O que é aqui um fato? A existência do sistema num dado instante? Sua conservação numa duração específica? A abrupta interrupção de se funcionamento ou as lentas alterações que transformam? É o mesmo, o sistema que vigeu em Roma quando do assassinado dos Graco e quando da rebelião de Catilina? E entre os muitos sistemas que podem ser distinguidos numa dada sociedade num dado espaço de tempo, que relações estabelecer entre eles? Que relações estabelecer entre as pessoas que vivem, falam e agem e os sistemas?
A primeira questão que deveremos nos colocar, portanto, não é se a História deva ou não descrever e explicar fatos, ser mais ou menos factual, mas o que se entende por um fato; muito antes de querer distinguir o que se entende por um fenômeno econômico, por um fenômeno cultural, político ou intelectual, deve-se saber o que, para o historiado, pode legitimamente se concebido como um fenômeno. Pois a criação da moeda fiduciária não é um fenômeno no mesmo sentido do acordo de Breton-Woods; a feitiçaria no século XVI não é fenômeno no mesmo sentido que os dogmas católico-romanos ou a doutrina do Malleus Maleficarum; os fatores das grandes navegações não são fatos históricos no mesmo sentido que a chegada de Colombo ao continente americano. Eventos, estruturas, fatores, condições, atos individuais, forças, processos, atos coletivos, sistemas, época, culturas, sociedades, raças, classes, sexos, papeis sociais, regras jurídicas, costumes, publicações, etc — têm todas essas categorias referentes reais ou são todas ou algumas delas meros instrumentos heurísticos de explanação? Que visa o historiador: dizer o que aconteceu verdadeiramente, como aconteceu ou por que aconteceu? Ou tudo isso junto? O que, por outro lado, o leigo e a comunidade científica podem legitimamente esperar do trabalho do historiador?
A primeira questão que deveremos nos colocar, portanto, não é se a História deva ou não descrever e explicar fatos, ser mais ou menos factual, mas o que se entende por um fato; muito antes de querer distinguir o que se entende por um fenômeno econômico, por um fenômeno cultural, político ou intelectual, deve-se saber o que, para o historiado, pode legitimamente se concebido como um fenômeno. Pois a criação da moeda fiduciária não é um fenômeno no mesmo sentido do acordo de Breton-Woods; a feitiçaria no século XVI não é fenômeno no mesmo sentido que os dogmas católico-romanos ou a doutrina do Malleus Maleficarum; os fatores das grandes navegações não são fatos históricos no mesmo sentido que a chegada de Colombo ao continente americano. Eventos, estruturas, fatores, condições, atos individuais, forças, processos, atos coletivos, sistemas, época, culturas, sociedades, raças, classes, sexos, papeis sociais, regras jurídicas, costumes, publicações, etc — têm todas essas categorias referentes reais ou são todas ou algumas delas meros instrumentos heurísticos de explanação? Que visa o historiador: dizer o que aconteceu verdadeiramente, como aconteceu ou por que aconteceu? Ou tudo isso junto? O que, por outro lado, o leigo e a comunidade científica podem legitimamente esperar do trabalho do historiador?
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[1] Certamente os que fazem História “de baixo para cima” não concebem os atos, palavras e acontecimentos da vida do homem vulgar do mesmo modo que os antigos e persistentes historiadores tradicionais concebem a vida dos homens ilustres. Os micro-historiadores, por exemplo, embora dirijam atenção para as existências anônimas não se interessam pelo que nelas há de singular e individual, mas no que podem testemunhar de fenômenos amplos como “cultura”, “sociedade”, “camponês”, “classe”, etc. Movem-se, portanto, numa pré-compreensão ontológica do fato histórico diametralmente contrária aos que fazem biografia dos homens “de importância”.
[2] Cf. Marx. 18 de Brumário de Napoleão.
segunda-feira, 30 de setembro de 2013
Mises: Revista interdisciplinar de Filosofia, Direito e Economia

Não pode haver ciência onde o debate racional está como que encerrado, onde doutrinas, por vezes obscuras, de pouca compreensão mas fácil reprodução, são admitidas como verdades assentadas sobre misteriosas evocações de autoridade. Retomando uma longa tradição crítica, nem faz um século ainda, Sir Karl Popper lembrou da necessidade, em sentido lógico mesmo, de manter-se o universo das teorias científicas aberto a críticas mútuas.
Por fim a interdisciplinaridade da qual hoje muito se fala e pouco se pratica. É verdade que a economia é uma ciência autônoma (não se há de contestar isso), mas é verdade também que muitos desvios teóricos, metodológicos e epistemológicos poderiam, nela, terem sido evitados se a antiga tradição humanística do século XIX não houvesse se perdido em meio aos devaneios alfanuméricos. Caminhos por evidente equivocados poderiam ter sido evitados, fantasmas de equívocos superados (valor-trabalho, monopólios, bens públicos) que povoam a teratologia economia poderiam já ter caído em esquecimento; outros, bons caminhos, poderiam ter se encurtado se a ciência da economia não se tivesse deixado seduzir por imagens de perfeccionismo científico, malgrado apenas imaginado. A crítica do filósofo é sempre suspeita, mas raramente injusta por completo. E já que não se critica a ciência mesma, mas o estado atual de uma ciência, é razoável ter a esperança de que a revista Mises contribuirá para a refundação da ciência econômica entre os trópicos, onde a razão anda a faltar-nos.
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