Marco Túlio Cícero |
Quo usque tandem abutere, Catilina, patientia nostra? quam diu etiam furor iste tuus nos eludet? quem ad finem sese effrenata iactabit audacia? Nihilne te nocturnum praesidium Palati, nihil urbis vigiliae, nihil timor populi, nihil concursus bonorum omnium, nihil hic munitissimus habendi senatus locus, nihil horum ora voltusque moverunt? Patere tua consilia non sentis, constrictam iam horum omnium scientia teneri coniurationem tuam non vides? Quid proxima, quid superiore nocte egeris, ubi fueris, quos convocaveris, quid consilii ceperis, quem nostrum ignorare arbitraris?
O tempora, o mores! Senatus haec intellegit. consul videt; hic tamen vivit. Vivit? immo vero etiam in senatum venit, fit publici consilii particeps, notat et designat oculis ad caedem unum quemque nostrum. Nos autem fortes viri satis facere rei publicae videmur, si istius furorem ac tela vitemus. Ad mortem te, Catilina, duci iussu consulis iam pridem oportebat, in te conferri pestem, quam tu in nos [omnes iam diu] machinaris.
An vero vir amplissumus, P. Scipio, pontifex maximus, Ti. Gracchum mediocriter labefactantem statum rei publicae privatus interfecit; Catilinam orbem terrae caede atque incendiis vastare cupientem nos consules perferemus? Nam illa nimis antiqua praetereo, quod C. Servilius Ahala Sp. Maelium novis rebus studentem manu sua occidit. Fuit, fuit ista quondam in hac re publica virtus, ut viri fortes acrioribus suppliciis civem perniciosum quam acerbissimum hostem coercerent. Habemus senatus consultum in te, Catilina, vehemens et grave, non deest rei publicae consilium neque auctoritas huius ordinis; nos, nos, dico aperte, consules desumus. [1]
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AQUI, o leitor pode ouvir o exórdio ou a inteira Oratio lida por Johan Winge. Observo somente que a leitura é feita usando a pronúncia restaurada do Latim Clássico, a qual muitos estudiosos fazem objeção. A maior vantagem dessa pronúncia é, sem dúvida, criar certa homogeneidade, já que, tradicionalmente, a pronúncia do Latim Clássico variava muito de um lugar a outro.
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Tradução[1]:
Até quando, Catilina, abusarás de nossa paciência? quanto zombará de nós ainda êsse teu atrevimento? onde vai dar tua desenfreada insolência? É possível que nenhum abalo te façam nem as sentinelas noturnas do Palatino[2], nem as vigias da cidade, nem o temor do povo, nem a uniformidade de todos os bons, nem êste seguríssimo lugar do Senado, nem a presença e semblante dos que aqui estão? Não pressentes manifestos teus conselhos? Não vês a todos inteirados de tua já reprimida conjuração? Julgas que algum de nós ignora o que obraste na noite passada e na antecedente, onde estiveste, a quem convocaste, que resolução tomaste?
Oh tempos! oh costumes! Percebe estas coisas o Senado, o cônsul as vê, e ainda assim vive semelhante homem! Que digo, vive? antes vem ao Senado, é participante do conselho público, assinala e designa com os olhos, para a morte, a cada um de nós. E nós, homens de valor, nos parece ter satisfeito à República, evitando as suas armas e a sua violência. Muito tempo há, Catilina, que tu devias estar morto por ordem de cônsul, e cair sôbre ti a ruína que há tanto tempo maquinas contra todos nós.
Por ventura o insigne P. Cipião[3], Pontífice Máximo[4], não matou Tibério Graco[5], por deteriorar um pouco o estado da República? e nós devemos sofrer a Catilina, que com mortes e incêndios quer assolar o mundo? Passo em silêncio aquêles antiquíssimos exemplos, de quando C. Servílio Ahala[6] matou com sua própria mão a Spúrio Melo, que procurava introduzir novidade. Houve antigamente na República uma virtude cívica tal que os homens de valor reprimiam com suplícios mais atrozes um cidadão pernicioso do que um cruelíssimo inimigo. Temos contra ti, Catilina, decreto do Senado veemente e severo; não falta conselho à República; nós, abertamente o digo, nós somos os que faltamos.
[1] Cícero. “Orações contra Catilina; Catilinária I” in: Orações; tradução de Pe. Antônio Joaquim. São Paulo: Atena Editora, 1957. Conservei a ortografia utilizada à época pelo tradutor. Julgo que de tal modo vai se desfigurando a Língua Portuguesa por tantos acordos e reformas, que honra ao texto afeito à correta pronúncia manter os antigos sinais de acento fonético, muito úteis de entonação.
[2] Monte Palatino, uma das sete colinas de Roma, junto a qual fora construído o Fórum.
[3] Públio Cornélio Cipião Emiliano Africano (185 a .C. - 129 a .C).
[4] Pontífice Máximo (Pontifex Maximus), i.e, o chefe o colégio de sacerdotes da religião oficial de Roma.
PS: Em breve algumas reflexões sobre o texto.
[1] CICERONIS. M. Tulii. "Oratio in Catilinam Prima in Senatu Habita" In: Cicero’s Orations. Projeto Gutenberg: 2008.
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